Veja aqui a primeira, segunda e terceira parte da Série conservação e sustentabilidade do sistema produtivo
Conservação e sustentabilidade
A conservação e a sustentabilidade do sistema produtivo estão intimamente relacionadas com o manejo agrícola em geral; principalmente, no que tange aos recursos naturais não renováveis. Isso porque a forma como o solo é manejado reflete em maior ou menor taxa de erosão, porque solos que são completamente cobertos, seja pela cultura ou pelos resíduos vegetais mantidos, são menos suscetíveis aos impactos da chuva, que é capaz de promover o carreamento de parte da camada mais superficial do solo. A desagregação das partículas e seu transporte vão sempre variar de acordo com o sistema de cultivo implantado, assim como com as formas de cultivo. Na agricultura, existem tipos de práticas que devem ser consideradas para proteção e conservação do solo e, consequentemente, para a sustentabilidade produtiva, que são as práticas conservacionistas.
Segundo Lepsch (2010), existem inúmeras práticas de conservar o solo, que podem ser separadas em três grandes grupos:
(1) caráter edáfico,
(2) caráter mecânico e
(3) caráter vegetativo.
Caráter edáfico
As práticas de caráter edáfico são medidas que tem por objetivo manter ou melhorar a fertilidade do solo, mantendo a faixa de disponibilidade do nutriente no solo sempre adequada para a cultura. Essas práticas baseiam-se em manejos como eliminação/controle de queimadas, adubações periódicas (incluindo a neutralização do pH) e a rotação de culturas.
Caráter mecânico
As práticas de caráter mecânico são medidas que visam a conservação do solo, mas utilizando maquinário. São práticas que promovem mudanças no relevo para corrigir possíveis declives para a implantação de sistemas de cultivo em curvas de nível. De modo geral, essas práticas podem ser essenciais em terrenos declivosos, para evitar perdas de solo por enxurradas. Um exemplo de prática mecânica é o terraceamento, que é muito eficiente no controle da erosão, desde que seja realizado de forma adequada e muito bem planejada.
Caráter vegetativo
As práticas de caráter vegetativo são medidas adotadas visando controlar a erosão, promovendo a manutenção da cobertura vegetal no solo. As principais que podemos citar são: reflorestamento, manejo adequado de pastagens (como por exemplo, os sistemas de integração, como o ILPF – Integração Lavoura-Pecuária-Floresta), controle de capinas e manutenção da cobertura do solo com a palhada (Sistema de Plantio Direto – SPD) (Figura 5). Essa última pode ser considerada uma prática de caráter edáfico também, pois contribui para a melhoria da fertilidade do solo. De modo geral, o SPD é uma boa alternativa de produção sustentável, que contribui para a conservação do solo, dos recursos hídricos e para a sustentabilidade do sistema produtivo, podendo ser adotado em algumas culturas de grande interesse, tais como o milho, a soja, o feijão e o trigo. Não apresenta utilização intensiva de maquinário, com arações e gradagens constantes, o que contribui para a manutenção da estrutura do solo. Além disso, esse sistema também é recomendado para ser realizado em produções com rotação de cultura, de modo que a palhada da cultura anterior se mantenha no solo, contribuindo para a proteção desse recurso, além de contribuir para a ciclagem de nutrientes.
Figura 1. Exemplos de práticas de caráter edáfico – manejo adequado das pastagens (à esquerda) e SPD (à direita). Fonte: Daiane Dalla Nora.
O SPD apresenta alguns pontos negativos, como a dificuldade da aplicação de herbicidas atingir o solo quando necessário (ex.: atuar no banco de sementes das plantas daninhas). No entanto, é importante destacar que o SPD é uma prática de manejo que contribui diretamente para o manejo das plantas daninhas, visto que a palhada forma uma barreira contra a germinação, além de funcionar também como uma barreira de proteção contra a entrada de luz, o que impede a germinação de sementes fotoblásticas positivas, que dependem da luz para germinar. Sendo assim, diante do exposto, é possível afirmar que a soma dos pontos positivos da implantação desse sistema é muito maior e, com isso, as vantagens se sobrepõem às pequenas desvantagens, constituindo-o, portanto, como uma excelente alternativa de cultivo.
O manejo adequado do solo contribui para inúmeros resultados positivos, como, por exemplo, a melhoria das características físicas, químicas e biológicas do solo, o que, diretamente, contribui para o aumento da produtividade da cultura de interesse. No caso da soja, o Comitê Estratégico Soja Brasil (CESB), que é uma Organização da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIP), atua com o objetivo de desafiar e estimular os sojicultores e responsáveis técnicos para desenvolver e aplicar práticas de manejo e cultivo inovadoras, associando o máximo da produtividade com a sustentabilidade do sistema produtivo. Os sojicultores participantes do Comitê afirmam que, a partir do manejo correto, é possível produzir em larga escala com sustentabilidade e viabilidade, o que mostra um cenário em que é possível produzir mais no mesmo espaço. Essa iniciativa é um grande exemplo a ser seguido para as mais diversas culturas de interesse do nosso país, visando produzir mais no mesmo espaço, conseguindo associar a máxima produtividade agrícola com a manutenção da qualidade dos recursos naturais e a sustentabilidade do sistema produtivo.
Resumindo…
Diante do exposto, é inegável a importância do manejo e da conservação dos solos, pois eles são bens valiosos, sem os quais não há produção. Sendo assim, o mais importante a assimilar é a necessidade do uso adequado das terras, sempre levando em consideração as suas aptidões naturais. A partir do conhecimento da capacidade produtiva, é possível propor planejamentos que considerem as recomendações e práticas corretas, que visam a conservação, a proteção e a manutenção da qualidade do solo.
REFERÊNCIAS
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