Os micro-organismos (principalmente bactérias e fungos), em conjunto, dão origem ao chamado microbioma do solo, o qual é composto por milhares de espécies. Estes organismos são encontrados no solo em número estimado de 109 células por grama de solo.
Eles são responsáveis, dentre outras coisas, por realizar a degradação da matéria orgânica, disponibilizar elementos essenciais para o desenvolvimento das plantas, atuar na proteção e resistência das plantas contra pragas e patógenos, participar da estruturação do solo, e promover o crescimento vegetal.
Diante dessas inúmeras funções, é notável a importância de estudar o microbioma do solo, compreender as interações existentes e assim contribuir para uma agricultura sustentável, o que demanda buscada na atualidade.
A Biome4all atua através de análises de metagenômica, ou seja, através do sequenciamento do DNA no solo. Esse sequenciamento permite identificar todos os fungos e bactérias existentes no solo, tanto os cultiváveis (obtidos em análises microbiológicas tradicionais) como os não cultiváveis. Com esses dados em mãos é possível predizer onde tais micro-organismos estão atuando no solo, se estão auxiliando na fertilidade, na proteção da planta ou se são micro-organismos que oferecem risco à cultura, como os patógenos.
Recentemente a Biome4all realizou um estudo que ilustra na prática a ocorrência de fitopatógenos e antagonistas em solos com soja, uma cultura de grande relevância no Brasil e no mundo.
Ocorrência de fitopatógenos em solos com soja
A podridão negra da raiz (Macrophomina phaseolina) e podridão vermelha da raiz (complexo de espécies Fusarium solani) ilustradas na figura 1 são doenças radiculares responsáveis por expressivos prejuízos econômicos no Brasil. A identificação precoce dos agentes causais é fundamental para a recomendação de medidas de controle apropriadas para evitar os danos.
Em 248 análises de metagenômica dos solos cultivados com soja, na safra 2021/2022 o patógeno Macrophomina phaseolina apareceu em 59% das amostras e o patógeno Fusarium Solani apareceu em 35% das amostras, segundo o banco de dados da Biome4all.
É importante lembrar que apenas a presença do patógeno na área não é suficiente para a ocorrência da doença e de seus danos. Os fatores que precisam coincidir no tempo e espaço para a ocorrência de doenças de plantas são:
-
Patógeno virulento
-
Ambiente favorável
-
Hospedeiro suscetível.
Porém, em algumas áreas, os danos da doença não são percebidos mesmo com a ocorrência dos três pressupostos. Neste caso, o solo pode estar apresentando características que suprimem o desenvolvimento de doenças por meio de uma comunidade microbiana estruturada que favorece o desenvolvimento e ação de antagonistas.
Estrutura da comunidade microbiana em solos com soja
Apesar da ocorrência do patógeno em boa parte das amostras analisadas pela Biome4all (Figura 2), algumas áreas não apresentavam doença, segundo o relato do produtor (Figura 3). Este fato motivou um estudo exploratório para entender se ocorriam diferenças na estrutura da comunidade microbiana das amostras de áreas com e sem doença.
Para isso, as amostras de solo de cultivo de soja com M. phaseolina e/ou F. solani foram subdivididas em dois grupos, com doença e sem doença. Em cada grupo foram realizadas análises de co-ocorrência, também chamadas de análises de redes de interação.
A figura 4 é uma representação gráfica das redes. Estas análises são metodologias avançadas nos estudos de microbioma, e ajudam a entender a interação entre os micro-organismos, seus papéis como antagonistas e no processo de supressividade do solo.
Nas amostras de áreas sem doença houve maior quantidade de conexões entre microorganismos, e também uma maior densidade (n° conexões realizadas/ n° conexões possíveis) em comparação às áreas com a doença.
Além disso, nas amostras sem doença, houve maior homogeneidade, o que significa que os micro-organismos da comunidade fizeram quantidades semelhantes de conexões. Estas características das áreas sem doença mostram uma comunidade mais equilibrada e com maior interação entre os micro-organismos.
Outra característica que pode ser observada nas redes são os módulos que são representados pelo cruzamento de várias linhas, formando um nó. Eles indicam grupos de micro-organismos que apresentam fortes relações, e quanto maior o número de módulos, mais complexa e estável é uma comunidade. Nas áreas sem doença, houve maior modularidade em comparação às amostras com doença.
Todas estas características sugerem que os solos de áreas com patógenos e sem doença, estavam mais estruturados e resilientes. A resiliência é importante e evita que fatores ambientais ou práticas agrícolas causem grandes distúrbios no microbioma e suas funções.
Alguns fatores que podem impactar o microbioma durante a safra são: aplicação de produtos químicos e biológicos, introdução de patógenos exóticos, secas, inundações, geadas tardias, entre outros.
Antagonistas de M. phaseolina e F. solani
Com base nos estudos de rede, dentre os micro-organismos antagonistas que ajudam no manejo de patógenos do fungo Macrophomina phaseolina estão as espécies do gênero Trichoderma utilizado com base de formulação de produtos biológicos para controle de podridão negra da raiz.
O gênero Bacillus também é relatado na literatura como um antagonista de M. phaseolina. Outros micro-organismos antagonistas a espécies de patógenos/insetos e que estiveram associados a M. phaseolina são Penicillium, Streptomyces, Metarhizium e Talaromyces. Todos os micro-organismos mencionados estão expostos na Figura 5.
Os antagonistas de Fusarium solani foram identificados dentro do gênero Bacillus e Trichoderma. Ambos são base de formulação de produtos comerciais utilizados no controle da podridão vermelha da raiz.
Micro-organismos reconhecidos como antagonistas de outros patógenos também foram relacionados, como Bradyrhizobium, Penicillium, e Streptomyces. Um fato interessante foi a associação negativa entre F. solani e outras espécies de Fusarium como F. oxysporum, F. lacertarum e F. polyphialidicum.
Por se tratar de um mesmo gênero, estes micro-organismos podem estar ocupando um mesmo nicho ecológico e podem estar competindo por espaço e alimento no solo durante a entressafra. Os fungos e bactérias antagonistas de F. solani estão relacionados na Figura 6.
Fato interessante é que Bradyrhizobium, Bacillus e Streptomyces, famosos antagonistas e que estiveram negativamente associados aos referidos patógenos, tiveram papéis de nucleadores – organismos fundamentais para manter a estrutura da comunidade.
Conclusões do estudo
Conclui-se que uma das hipóteses para a ausência de doenças em algumas áreas analisadas pela Biome4all é a estrutura da comunidade microbiana. Boas práticas agronômicas que favorecem um solo mais supressivo e resiliente são:
-
Rotação de culturas
-
Não revolvimento do solo
-
Uso de plantas de cobertura com vigoroso sistema radicular e volume de parte área.
De acordo com Baker & Cook (1974) uma das práticas para prospectar antagonistas para o controle biológico é procurar em locais onde a doença é menos severa.
Assim, estudos com análises avançadas do microbioma podem ser úteis para identificar micro-organismos adaptados e com ações antagônicas nas áreas sem doença a fim de obter organismo puro, entre outras práticas para o desenvolvimento de bioinsumos.