O trabalho traz alguns pontos a serem observados durante o posicionamento de fungicidas a fim de propiciar a maior eficácia de controle de doenças em soja
Controle x Epidemia
Nosso sistema agrícola é intensivo e altamente produtivo localizado nos cenários tropical e subtropical, onde as condições edafoclimáticas permitem com que as exigências para sobrevivência e infecção do patógeno ocorram de forma acelerada.
Assim, a relação entre os patógenos e o hospedeiro pode ser estabelecida em qualquer fase do ciclo da cultura, e quando esta relação é compatível, temos o processo doença instalado.
Este fato justifica porque realizamos cada vez mais aplicações no ciclo da cultura para tentar controlar as doenças que parecem estar cada vez mais incontroláveis.
Talvez no equívoco de interpretação do conceito possa residir o principal fato para explicar a oscilação de eficácia dos fungicidas.
Por vários anos, e ainda hoje, o controle da doença é entendido no campo como a aplicação do fungicida sobre o sintoma, na esperança que o patógeno seja erradicado e o residual do controle permaneça atuando na folha da planta.
No entanto, isso é um processo biologicamente impossível, visto as condições edafoclimáticas onde estamos trabalhando: pressão de inóculo, fungicidas e tecnologia de aplicação, que favorecem o estabelecimento do patossistema.
Sintoma: tecido já danificado
Vale lembrar que o sintoma é o resultado final do ciclo da doença, que iniciou sua infecção 7 a 14 dias antes, em etapas invisíveis ao olho humano (Figura 1).
Ao final, a expressão do sintoma identifica a etapa reprodutiva do patógeno na geração de seus descendentes com grande variabilidade genética sobre o tecido já danificado.
Via de regra, nenhum fungicida tem potencial para controlar sintoma estabelecido sobre o tecido da folha, ou seja, erradicativo.
A maior eficácia imprimida por qualquer fungicida é quando esse for posicionado sobre o tecido da folha antes da chegada do esporo, ou seja, preventivo ou protetor, especialmente estrobilurinas e carboxamidas.
À medida que a infecção começa a se estabelecer, a eficácia do fungicida vai decrescendo gradativamente e com isso também o residual (Figura 2).
<
Preventivo, Curativo ou Erradicante?
É importante lembrar que os momentos de aplicação Preventivo, Curativo ou Erradicante, não têm relação direta com o estádio fisiológico da planta e sim com o estágio da patogênese.
Assim, poderemos ter aplicações preventivas no estádio vegetativo de uma soja semeada no início da época recomendada, bem como curativa ou até erradicante para este mesmo estádio em área semeada no final da época recomendada ou mesmo safrinha.
Baseado nestes pressupostos é possível dizer que é um erro atribuir uma eficácia “fixa” para um fungicida, com se mantivesse seu desempenho, independente do momento da aplicação.
Programa de aplicação: a busca pela maior eficácia
Não é difícil observar situações de campo onde o mesmo produto, aplicado em momentos diferentes, imprima eficácias que podem ter grandes variações de desempenho.
Desta forma, o foco do manejo eficiente é buscar a eficácia do conjunto das aplicações, ou seja, do Programa de Aplicações e não somente no potencial de um ou outro produto a ser aplicado, ainda pior se nas últimas aplicações. Com isso, o objetivo passa a ser a proteção da área foliar que irá ser a fonte para enchimento dos drenos [grãos] e não a tentativa de controle da doença estabelecida.
A montagem do Programa de Aplicações tem suporte no entendimento de que o efeito das aplicações não são independentes e sim possuem relações diretas entre elas, ou seja, a função da aplicação
- 1 é entregar a folha protegida para a aplicação
- 2, que por sua vez precisa entregar a folha protegida para a aplicação
- 3, e assim por diante….
Assim, é possível manter a doença em nível baixo dentro do Programa, sem que ocorram possíveis falhas de eficácia entre as aplicações e a doença acelere sua evolução (Figura 3).
Além disso, o sucesso do Programa de Aplicações na folhagem vai depender do papel fundamental do Tratamento de Sementes (TS), especialmente para doenças necrotróficas, cujo patógeno está localizado na semente ou no solo/palhada.
Certamente, quando um TS não é levado em consideração, haverá dificuldades de controle de doenças que irão causar manchas na folhagem da planta, reduzindo a eficácia de todas as aplicações.
Aplicação em vegetativo
Já na parte aérea da planta, o início efetivo do Programa passa a ser a aplicação no período vegetativo da cultura por três motivos técnicos específicos relacionados com o patógeno, a tecnologia de aplicação e a planta.
Aplicação em vegetativo: fator patógeno
Com relação ao primeiro, o foco é sempre a aplicação preventiva, buscando proteger o tecido antes da entrada do patógeno, pois grande parte dos esporos chegam no período vegetativo da planta.
Outro ponto positivo para o manejo é que o estabelecimento e a evolução do patossistema nesta fase são de grande dificuldade para o patógeno.
Sendo assim, a entrada nesta fase reduz drasticamente a multiplicação do inóculo inicial que irá causar a epidemia durante o estádio reprodutivo da cultura (Figura 4).
Aplicação em vegetativo: fator tecnologia de aplicação
A tecnologia de aplicação tem grandes dificuldades de levar as gotas para o dossel inferior da cultura, especialmente quando ela atinge seu máximo IAF (Índice de Área Foliar), durante o estádio reprodutivo (Figura 5).
Aplicação em vegetativo: fator planta
Por último a planta, especificamente tocando sobre a idade da folha.
Tecidos novos e interceptando radiação direta possuem características morfológicas e fotossintéticas que favorecem a retenção do ingrediente ativo posicionado sobre ele, mantendo maior o período residual.
Por outro lado, folhas mais velhas e interceptando menos radiação direta apresentam o oposto (Figura 6).
Portanto, a falta de entendimento das relações entre as aplicações na construção do Programa pode levar à perdas precoces de área foliar, resultando diretamente em baixa produtividade.
É importante retomar que a eficácia buscada deve ser do Programa de Aplicações, compreendendo em que momento a aplicação está sendo posicionada no estádio da planta e sua relação com os patógenos.
Assim, a leitura do ambiente é fundamental para a percepção técnica do período residual, que poderá variar e houver necessidade de reorientação dentro do Programa para manter a doença em nível baixo.