Os programas de melhoramento da cultura da soja têm como objetivo o desenvolvimento de genótipos altamente produtivos, que contemplem o máximo de características agronômicas desejáveis, e que os genótipos sejam consistentes nos mais distintos ambientes de cultivo, mantendo desempenho constante em função das modificações impostas por fatores bióticos e abióticos. A probabilidade de obtenção de um genótipo de soja com tais características é muito restrita, visto que, os genótipos apresentam grande variação em seu desempenho agronômico devido às condições ambientais as quais estão submetidos, sendo este efeito denominado de interação genótipos x ambientes (GxA). A interação genótipo x ambiente consiste no desempenho diferencial dos genótipos devido às alterações nos ambientes, ou seja, a resposta de cada genótipo é específica e diferente de outro em função das modificações que ocorrem nos ambientes (ALLARD, 1999).
O efeito da interação genótipos x ambientes restringe e dificulta o ganho de seleção e com isso, a recomendação de genótipos superiores para uma extensa região produtora. Dessa forma, é importante aos melhoristas o conhecimento das causas e das consequências dessa interação, sendo possível identificar e interpretar de maneira correta, possibilitando realizar inferências precisas na recomendação de novos genótipos da soja.
Interação genótipos x ambientes
O fenótipo de um indivíduo da soja é determinado por sua constituição genética (genótipo) e pelo efeito do ambiente, dessa forma, o Fenótipo (F) = Genótipo (G) + Ambiente (A), diante disto, o fenótipo é resultado da ação conjunta dos efeitos genotípicos e do ambiente em que a planta está exposta. Entretanto, existe um terceiro componente nesta equação, correspondendo a um efeito adicional, além dos efeitos genéticos e ambientais, denominado de interação genótipos x ambientes (IGA). Assim, obtém-se uma equação biológica, onde o Fenótipo (F) = Genótipo (G) + Ambiente (A) + Interação genótipos x Ambientes (IGA). O terceiro componente é obtido ao avaliar o desempenho de dois ou mais genótipos da soja em diferentes ambientes de cultivo.
A interação genótipo x ambiente é caracterizada quando o comportamento fenotípico dos genótipos não é consistente nos diferentes ambientes, onde as respostas dos genótipos se modificam devido às alterações que ocorrem de forma intrínseca no ambiente, ou seja, reflete em diferenças quanto à sensibilidade dos genótipos às mudanças do ambiente. A variação da interação é a proporção da variação fenotípica determinada pelos efeitos das interações entre os diferentes genótipos e as diferentes condições ambientais a que esses genótipos foram submetidos (ALLARD, 1999).
O ambiente exerce grande efeito sobre a expressão do fenótipo. Dessa forma, os fatores ambientais afetam os caracteres por meio de diferentes estímulos e mecanismos fisiológicos (FALCONER, 1987). Existem duas condições que contribuem para a interação genótipos x ambientes, sendo a primeira decorrente da variação previsível que inclui as variações ambientais inerentes a cada área de distribuição da cultura. Há também a variação imprevisível, revelada pela sazonalidade da distribuição de chuvas, temperatura do ar e do solo, umidade relativa do ar, incidência de patógenos e insetos-praga, ocorrência de geadas e granizo.
As causas genéticas da interação genótipos x ambientes podem ser atribuídas a fatores fisiológicos, bioquímicos, adaptativos e relativos à escala de representação dos caracteres. Dentre os fatores fisiológicos e bioquímicos que afetam o desempenho do genótipo destaca-se a capacidade de absorção, transporte e uso de nutrientes, competição intra-específica e inter-específica entre plantas, tolerância a herbicidas e alelopatia, eficiência no uso da água, nutrientes e interceptação da radiação fotossinteticamente ativa.
A interação genótipos x ambientes é determinada geneticamente pela variação dos locos em homozigose, heterozigose e pela covariância dos efeitos gênicos destes locos. Isto ocorre quando a contribuição dos genes que controlam o caráter, ou o nível de expressão dos caracteres difere entre os ambientes, visto que a expressão dos genes é regulada e influenciada pelo ambiente. Quando se realiza estudos visando os caracteres complexos, os quais são controlados por um grande número de genes e influenciados direta e indiretamente pela expressão de outros caracteres de ordem primária ou secundária, evidencia-se que as manifestações desses genes variam entre os ambientes de cultivo. De acordo com Falconer e Mackay (1996) a correlação genética entre ambientes possibilita comprovar que os genótipos diferem no seu comportamento em função do ambiente. Considerando que o número de genes envolvidos na expressão do caráter, a interação genótipos x ambientes é menos importante para caracteres mono e oligogênicos, pois a expressão desses caracteres é menos influenciada pelo efeito de ambiente, maior herdabilidade e menor número de classes fenotípicas.
A interação genótipo x ambiente afeta o ganho por seleção, tornando-se necessário estimar a magnitude e a natureza desta interação, a fim de avaliar o real impacto da seleção e assegurar o alto grau de confiabilidade na recomendação dos genótipos para um determinado grupo de ambiente. Ao considerar o impacto da seleção ou o ganho por seleção é imprescindível ponderar as estimativas de herdabilidade, que é definida como o quociente entre a variação genotípica e a variância fenotípica. Dessa forma, é necessário remover as variâncias oriundas dos efeitos da interação genótipos x ambientes, para obter a verdadeira variância genética (ALLARD, 1971). Para isso, realiza-se uma análise de variância cruzada com duas entradas, sendo genótipos x ambientes que fornecerá estimativas da variância genotípica, da variância causada pelos ambientes, e da variância atribuível a interação genótipos x ambientes (FALCONER, 1987).
A capacidade do genótipo em manter o seu desempenho estável frente às alterações no ambiente é denominado de homeostase, ou seja, a capacidade da planta em adaptar suas funções fisiológicas às constantes mudanças do ambiente onde está inserida, de forma a ser menos afetada por estas mudanças. Essa capacidade de manter o seu desempenho é atribuída aos níveis de plasticidade fenotípica para caracteres fisiológicos e morfológicos.
Tipos de interação genótipos x ambientes
O estudo do desempenho agronômico de genótipos da soja em diferentes ambientes (interação genótipos x ambientes) pode resultar em três circunstâncias distintas: ausência de interação; interação simples ou quantitativa; e interação complexa ou cruzada. A identificação e a decomposição da interação que ocorre entre os genótipos e os ambientes apresentam-se fundamental ao melhorista, pois com base nessa resposta é possível elaborar o planejamento, o posicionamento dos genótipos e destiná-los a ambientes específicos, caso exista interação significativa.
A Figura 1 tem como finalidade representar exemplos hipotéticos que envolvam a interação genótipos x ambientes na cultura da soja. Na figura 1-A, encontra-se uma situação que revela ausência de interação, onde os ambientes promovem as mesmas modificações no desempenho relativo dos genótipos estudados G1 e G2, o que é comprovado quando consideramos as distâncias (d1, d2, d3), as quais são equidistantes estatisticamente, ou seja, d1=d2=d3 e o limite da interação tende a zero.
Na figura 1-B evidencia-se a presença de interação simples ou quantitativa, sendo está causada por diferenças de variabilidade entre os genótipos nos ambientes, de forma que a posição relativa dos genótipos não é alterada. Pode-se constatar na Figura 1-B que os ambientes A1, A2 e A3 influenciaram de forma diferente o desempenho dos genótipos (G1 e G2), visto que as distância d1, d2 e d3 são diferentes estatisticamente, porém, não houve alteração na ordenação dos genótipos. A manifestação da interação é consequência exclusivamente da conceituação aditiva do fenômeno e pode ser explicada, pela ação multiplicativa dos ambientes sobre os genótipos. A interação simples é menos problemática para o melhoramento genético de plantas, pois não acarreta em dificuldades na seleção dos genótipos da soja, devido principalmente não haver modificação do ranqueamento dos genótipos.
Na figura 1-C evidencia-se a ocorrência da interação do tipo complexa ou cruzada, neste caso identifica-se a falta de correlação entre o desempenho dos genótipos nos ambientes, ou seja, a inconsistência da superioridade de genótipos devido a variação ambiental. Dessa forma, existem genótipos que apresentam um comportamento superior em um determinado ambiente, mas à medida que se altera as condições do ambiente o desempenho não é mantido, visto que tais características específicas proporcionadas pelo ambiente têm efeito positivo sobre outro genótipo. Com isso, os efeitos causados pelo ambiente possuem efeitos distintos sobre os genótipos, alterando o ordenamento do desempenho dos genótipos, mesmo em casos que as distâncias d1, d2 e d3 permaneçam equidistantes estatisticamente. A falta de correlação entre os genótipos nos ambientes dificulta a seleção daqueles adaptados, dessa forma, o trabalho do melhorista pode ser comprometido, pois têm que selecionar genótipos específicos para cada ambiente.
O estudo da decomposição da interação em partes simples e complexas consiste em realizar a partição do quadrado médio da interação genótipos x ambientes, e determinar quanto de seus efeitos são oriundos da fração de tipo simples e complexa. Para o estudo da interação genótipos x ambientes e suas decomposições necessita-se atender a pressuposição de ter avaliado no mínimo dois genótipos em dois ambientes, sendo possível assim estimar quanto da variação fenotípica é decorrente da interação.
Referências
ALLARD, R.W. Princípios do melhoramento de plantas. São Paulo: Edgard Blücher, 1971, 381p.
ALLARD, R.W. Principles of plant breeding. 2ªed. New York: John Wiley & Sons, 1999. 254p.
FALCONER, D.S. Introdução à genética quantitativa. Viçosa: Editora UFV, 1987.279p.
FALCONER, D.S.; MACKAY, T.F.C. Introduction to quantitative genetics.4ªed.Longmans Green, Harlow, Essex, UK, 1996, 464p.