As doenças estão entre os fatores que mais depreciam a produtividade da cultura da soja no Brasil, com destaque para as doenças foliares causadas por fungos. Entre essas, destacam-se a antracnose (Colletotrichum spp.), o crestamento foliar por Cercospora (Cercospora spp.), a ferrugem asiática (Phakopsora pachyrhizi), a mancha alvo (Corynespora cassiicola), a mancha parda (Septoria glycines) e o oídio (Microsphaera diffusa). O dano causado por essas doenças varia de acordo com a safra, a região, a época de semeadura, a suscetibilidade da cultivar e o manejo adotado.
A aplicação de fungicidas tem sido uma das estratégias mais importantes no controle de doenças na cultura da soja. Os principais modos de ação utilizados na soja incluem os fungicidas sítio-específicos inibidores da desmetilação (DMIs), da quinona externa (QoIs) e da succinato desidrogenase (SDHIs). Além disso, fungicidas multissítios, como o mancozebe, os cúpricos e o clorotalonil também entraram no rol de ingredientes ativos aplicados na cultura.
Embora exista mais de uma centena de produtos comerciais disponíveis para o controle de doenças foliares na soja, em muitas situações o controle fica aquém do esperado, resultando em perdas de produtividade. Diversos fatores podem estar relacionados à menor eficácia dos fungicidas, incluindo a escolha equivocada de produtos para os alvos presentes na área, o início tardio das aplicações, a dilatação excessiva dos intervalos entre as aplicações, a tecnologia de aplicação inadequada e o número equivocado de aplicações. Neste estudo, foi investigado o efeito do número de aplicações de fungicida na produtividade de diferentes cultivares de soja.
Os experimentos foram conduzidos na área experimental da Universidade Tecnológica Federal do Paraná – Campus Santa Helena nas safras 2019/2020 e 2020/2021, com semeaduras realizadas na segunda quinzena de outubro. A população final foi de aproximadamente 250 mil plantas ha-1, com espaçamento entre linhas de 0,45 m. A adubação de base consistiu na aplicação de 300 kg ha-1 de adubo NPK (02-20-18). O controle de plantas daninhas em pós-emergência foi realizado com o herbicida glifosato (Shadow, 2 L ha-1) e o de pragas com os inseticidas lambda-cialotrina + tiamethoxam (Platinum Neo, 0,15 L ha-1).
Em ambas as safras, os experimentos consistiram numa variação do número de aplicações de fungicida (zero, duas ou quatro aplicações) em diferentes cultivares de soja. As cultivares Syn 1258 RR, M6410 IPRO, M5947 IPRO, NA 5909 RG, BS 2606 IPRO, Syn 1059 RR, BMX Garra IPRO, BMX Delta IPRO foram avaliadas na safra 2019/2020. Na safra 2020/2021, foram usadas as seguintes cultivares: NA 5909 RG, BMX Lótus IPRO, 96R10 IPRO, 96Y90, TMG 7063 IPRO, BMX Garra IPRO, BMX Potência RR, BMX Fibra IPRO, 95R95 IPRO, M6210 IPRO, BS 2606 IPRO, M6410 IPRO, Syn 1258 RR, 96R29 IPRO, Syn 1059 RR, DM 6563 IPRO, BMX Delta IPRO, Syn 15630 IPRO, HO Pirapó IPRO, M5947 IPRO. As aplicações de fungicida foram realizadas aos 65 e 80 dias após a emergência (DAE) para o tratamento com duas aplicações e aos 35, 50, 65 e 80 DAE para o tratamento com quatro aplicações de fungicida. Para ambos os tratamentos foram utilizados o fungicida picoxistrobina + ciproconazol (Aproach Prima, 0,3 L ha-1), acrescido de 0,5% de óleo mineral (Nimbus) nas aplicações realizadas aos 65 e 80 DAE.
Para o tratamento com quatro aplicações, o fungicida usado nas aplicações realizadas aos 35 e 50 DAE foi picoxistrobina + benzovindiflupir (Vessarya, 0,6 L ha-1). Em todas as aplicações, foi adicionado o fungicida protetor multissítio mancozebe (Unizeb Gold, 1,5 kg ha-1). As aplicações foram realizadas com um pulverizador costal pressurizado a CO2 com seis pontas de pulverização ADI 110 015 (Jacto) espaçadas 0,5 m entre si, pulverizando numa vazão de 100 L ha-1. O delineamento experimental foi inteiramente casualizado com quatro repetições. Cada unidade experimental consistiu em seis linhas de semeadura espaçadas em 0,45 m, com cinco metros de comprimento. Para as avaliações de produtividade foram consideradas apenas as quatro linhas centrais, descartando-se 0,5 m de cada cabeceira.
Os dados foram submetidos à análise de variância (ANOVA), e análises de regressão linear foram efetuadas para descrever a relação entre o número de aplicações de fungicida e a produtividade.
As doenças mais prevalentes na área foram a mancha alvo (em ambas as safras) e a antracnose (safra 2020/21). Em ambas as safras, a aplicação de fungicidas resultou em menores severidades de doenças e maiores produtividades em relação às áreas não tratadas. De modo geral, a severidade foi menor e a produtividade foi maior no tratamento com quatro aplicações de fungicidas em relação ao tratamento com duas aplicações (Figuras 1 e 2). Na média das cultivares, houve aumento de 2790 kg ha-1 na produtividade do tratamento sem fungicida para 3077 e 3299 kg ha-1 nos tratamentos com duas e quatro aplicações de fungicida, respectivamente, na safra 2019/20. Os incrementos na produtividade variaram entre 52, 127 e 232 kg ha-1 para cada aplicação de fungicida, considerando a cultivar menos responsiva, a média das cultivares e a cultivar mais responsiva, respectivamente.
Figura 1. Imagens de folíolos de soja obtidas de plantas dos tratamentos sem aplicação de fungicida (A) e com duas aplicações (B) ou quatro aplicações (C) na safra 2019/2020. Santa Helena-PR, 2022.