Neste material, você vai conhecer um pouco mais sobre:
- as manchas foliares que ameaçavam a produção de algodão;
- os patógenos causadores de manchas foliares que são as principais doenças do algodoeiro na atualidade.
Manchas foliares que ameaçam a produção de algodão
Desde que o cultivo de algodão se concentrou no Cerrado brasileiro, tornando essa região a maior produtora do país e colocando o Brasil como 4° maior produtor e 2° maior exportador de fibras, a incidência de doenças vem sendo um desafio frequente. Mesmo que os patógenos que vivem no solo configurem um problema frequente, são as manchas foliares que têm dado a maior dor de cabeça aos produtores e que são as responsáveis pelos maiores danos.
Inicialmente, a mancha foliar que dominava as lavouras e causava os maiores prejuízos era a ramulose (Colletotrichum gossypii var. cephalosporioides). Porém, com o desenvolvimento de cultivares resistentes e com a utilização precoce de fungicidas, esta doença deixou de ser um problema para os cotonicultores.
Além da ramulose, outras doenças também causaram danos ao passar das safras, como as manchas de alternária e estenfílio (Alternaria alternata e Stemphylium solani), de mirotécio (Myrothecium roridum) e a mancha angular (Xanthomonas citri subsp. Malvacearum).
Mancha de ramulária: a principal doença
Atualmente, de todas as doenças que já atacaram o algodoeiro causando preocupação entre produtores, a doença que se mantém como uma grande ameaça é a mancha de ramulária (Ramularia areola), sendo considerada a principal doença da cultura no nosso país.
A mancha de ramulária (Figura 1) está presente em todas as regiões que cultivam algodão no Cerrado e também nos locais mais frios e úmidos do semiárido, além de ser encontrada em lavouras de São Paulo e no Paraná, com menor intensidade.
Por ser uma doença que ocorre da base para o ápice da planta, é comum que as folhas do terço inferior caiam quando as medidas de controle químico não são adotadas de forma correta, o que pode gerar danos significativos. Esta queda intensa também é capaz de contribuir para a abertura precoce dos capulhos, comprometendo a qualidade da fibra.
Como controlar a mancha de ramulária?
Essa doença já causou danos muito significativos à cultura, e consequentemente, gerou perdas econômicas gigantescas aos cotonicultores. Segundo Araújo et al. (2020), a mancha de ramulária levou a um prejuízo de aproximadamente US$ 360 milhões na safra 2019/2020, somando-se as perdas da lavoura e o custo do controle químico (Figura 2). Além disso, não se pode deixar de considerar que o fungicida aplicado no algodão com o melhor resultado para esta doença chega a um nível de controle de 84%.
Para o controle da mancha de ramulária, o produtor de algodão faz uso de cultivares resistentes e de fungicidas. Porém, uma grande porção de cultivares utilizadas no Brasil não possuem resistência completa à doença, o que consiste em uma estratégia valiosa para o manejo da doença.
O controle químico deve ser iniciado com o primeiro sinal da presença do patógeno, ou tão logo as primeiras lesões sejam reconhecidas nas folhas mais velhas. Neste cenário, o monitoramento da lavoura é importante e deve ser realizado desde cedo, já que a doença pode acometer a cultura antes mesmo dos 40 dias após a emergência das plantas.
Para que os fungicidas aplicados apresentem resultados satisfatórios, são demandadas de quatro a oito aplicações, chegando até a doze aplicações do início do ciclo do algodoeiro até sua colheita (LAMAS; CHITARRA, 2014).
Pensando na escolha correta do fungicida, conhecer seu modo de ação, a época em que deve ser aplicado, assim como o intervalo de aplicação recomendado, junto com o desenvolvimento de um programa de aplicações que alterne ingredientes ativos com diferentes modos de ação, é de suma importância para que o controle químico seja efetivo, resultando também em uma estratégia relevante ao surgimento de populações do patógeno que sejam resistentes.
Alguns estudos trazem importantes informações acerca da eficiência dos fungicidas utilizados no controle da ramulária. De acordo com estes estudos, alguns dos fungicidas do grupo dos triazóis estão apresentando uma eficiência reduzida. Ao contrário de outros fungicidas, que estão apresentando uma alta eficiência, e que possuem diferentes modos de ação. Dentre esses, alguns já estão disponíveis no mercado e outros estão em fase de registro, tentando um Registro Especial Temporário no Ministério da Agricultura. Ainda segundo estes estudos, os fungicidas multissítio à base de cobre e clorotalonil, quando associados a sítio específico, apresentam efeito sinérgico, mostrando-se uma alternativa promissora para o manejo da resistência dos patógenos aos fungicidas (ARAÚJO et al., 2020).
Sistema de produção de algodão no Cerrado e a adaptação de patógenos
No Cerrado, a produção de algodão está ligada ao cultivo de soja e milho, num sistema agrícola reproduzido há anos, que pode ter levado à adaptação de alguns patógenos de uma cultura para outra – como observado na Bahia e em Minas Gerais, onde foi identificado o patógeno causador do mofo-branco (Sclerotinia sclerotiorum) em algodão (CHARCHAR, 1996). Esta doença acometia lavouras irrigadas por pivô central em sucessão ao feijão. Dessa forma, o mofo-branco foi disseminado por quase toda a região do Cerrado, mesmo que os casos mais severos da doença sejam localizados. O cultivo de crotalária visando à cobertura do solo é uma prática que favorece a multiplicação dos escleródios do patógeno, por esta ser uma cultura suscetível à doença.
Mancha-alvo em algodão
A mancha-alvo (Corynespora cassiicola) (Figura 3) é outra doença de relevância para os cotonicultores, a qual, anteriormente, era somente uma ameaça à soja.
Como a grande parte das lavouras que são cultivadas com algodão tiveram, antes deste, a soja, a doença permanece na área conforme esta vai sendo cultivada com diferentes espécies, resultando em danos severos. Todavia, as pesquisas ainda não demonstraram as perdas ocasionadas pela mancha-alvo, mesmo essa sendo tão agressiva, com lesões necróticas chegando a 20 mm de diâmetro e levando à desfolha rápida e precoce das plantas
Corynespora cassiicola em algodão e em soja
Já é sabido que o patógeno C. cassiicola pode ter sua origem em lavouras de soja ou de algodão, e causar a doença em ambas as culturas (GALBIERI, 2014). Neste cenário, a produção de inóculos na lavoura de soja gera fonte de inóculo primário para a lavoura de algodão em segunda safra, e até mesmo na safra seguinte de algodão, quando este é cultivado em uma safra única (SUASSUNA et al., 2015).
Estudos mais recentes apontam a presença do patógeno causador da mancha-alvo em cultivos de algodão na região do Vale do Rio Araguaia, nos municípios de Canarana e Bom Jesus, no Mato Grosso (JULIATTI et al., 2020).
Ainda não está claro quais os danos causados pela doença à cultura, mas já é visto que o monitoramento deve ser frequente para que o controle de novos focos da doença seja realizado no momento correto, evitando-se perdas significativas.
Como visto, o sistema de produção que coloca soja, milho e algodão em cultivos sequenciais precisa ser revisto e ajustado, para evitar que novos patógenos emerjam e causem prejuízos aos produtores.
Este artigo é de autoria de: José Otávio Menten, presidente do Conselho Científico Agro Sustentável; e de Alderi Emídio de Araújo, Pesquisador e Chefe Geral da Embrapa Algodão, e foi publicado originalmente pela Revista Cultivar.