- Importância de as doenças foliares
- Estratégias de manejo de doenças de acordo com a propriedade
- Arranjo de plantas e manejo de doenças
- Porque fazer tratamento de sementes
- Controle químico em parte aérea – preventivo x curativo
Introdução
A grande diversidade de doenças na cultura da soja torna o manejo integrado uma estratégia obrigatória para um controle eficiente e sustentável. Embora algumas doenças tenham sua ocorrência restrita a algumas regiões (mela, mofo branco, oídio, mancha alvo, antracnose), é possível observar incidência cosmopolita de outras doenças (ferrugem, DFC, podridões radiculares).
A complexidade de alvos agrava o problema na cultura da soja, sendo estimado dano significativo devido a diversas doenças (Tabela 1).
Controlar doenças considerando as características da lavoura brasileira é, sobretudo, um exercício de estratégia operacional e técnica. No âmbito da estratégia operacional, fatores climáticos são tão decisivos quanto a escolha de uma cultivar, de uma data de semeadura, de uma semeadora, ou de um defensivo.
Em um cenário onde a diversidade de alvos é crescente e cada vez mais precocemente estabelecida, programas de controle devem considerar as características fitotécnicas e fisiológicas das diversas cultivares como ponto de partida para garantir sua sustentabilidade.
Cultivares altamente produtivas podem apresentar declínio na rusticidade e, se o ciclo for reduzido, haverá uma dependência crescente na preservação da área foliar verde.
O grau de importância que for dada à expressão fisiológica da cultura será determinante para viabilizar a expressão do potencial produtivo das diferentes cultivares.
A dimensão das áreas de cultivo, principalmente no Cerrado Brasileiro, obriga os produtores a priorizarem aspectos gerenciais e operacionais, muitas vezes em detrimento de programas tecnicamente eficientes de controle das doenças.
O grande desafio neste caso é o desenho de estratégias tecnicamente embasadas, mas não conflitantes com decisões operacionais ou administrativas.
Manejo das doenças
Diversos são os fatores ligados ao correto manejo das doenças na cultura da soja (Figuras 1 e 2). Provavelmente uma hierarquização dos fatores seja impossível de ser feita tendo em vista a complementariedade dos fatores. Contudo, assumindo serem decisivas as decisões operacionais e técnicas no processo, fatores da fazenda e do ambiente certamente serão decisivas.
A tomada de decisão com base nos parâmetros de infraestrutura e aconselhamento técnico são o ponto de partida. A determinação das fontes de inóculo e taxa de progresso de cada doença (ou do seu conjunto) são parâmetros determinantes na interação Ambiente x Patógeno x Hospedeiro.
Ambiente (2) – Condições ambientes
Umidade elevada e água livre sobre a folhagem da planta são necessários para infecções secundárias de muitas doenças fúngicas e bacterianas da parte aérea da planta (Figura 3). O período entre a deposição de um esporo até a penetração da hifa de infecção pode ser de 6 a 24 horas.
A água pode afetar a sobrevivência, dispersão e inoculação dos patógenos, favorecendo o estabelecimento das doenças. Os patógenos possuem diversas estruturas de sobrevivência que podem se manter viáveis no solo durante longos períodos. Um dos fatores que podem interferir significativamente na longevidade destas estruturas é a quantidade de água no solo.
As sementes infectadas constituem-se em outra fonte de inóculo importante. Uma das formas de dispersão de propágulos de patógenos está relacionada ao ciclo secundário de infecção, quando sobre as lesões esporuladas é observado o efeito do impacto das gotas da água de chuva ou irrigação, projetando-os para outras partes da planta ou mesmo para outras plantas.
O processo de inoculação de um patógeno envolve a deposição de um propágulo sobre a superfície de uma planta e sua posterior penetração para colonização dos tecidos. No caso dos patógenos fúngicos, após a deposição dos propágulos a penetração pode ocorrer via aberturas naturais ou diretamente a partir tanto da ação física do tubo de infecção, como enzimática, através da degradação de compostos constituintes da epiderme.
Em ambos os casos a duração do molhamento foliar é uma das condições mais predisponentes para o estabelecimento de uma interação compatível.
A disponibilidade de água livre sobre a superfície foliar, causada por precipitações frequentes ou irrigação, associada à temperatura noturna entre 18 e 26o C, são as condições fundamentais para o início da infecção, dispersão do patógeno e desenvolvimento severo da epidemia da ferrugem asiática. A partir da infecção inicial a ferrugem pode progredir rapidamente, atingindo severidade elevada em menos de 20 dias.
Soja (3) – Controle genético
Esforços têm sido despendidos no sentido da obtenção de cultivares com resistência a doenças. A resistência varietal construída com base oligogênica gera forte tendência de surgimento de isolados virulentos e consequente instabilidade. Em diversos casos a rotação varietal associada à proteção química pode aumentar a durabilidade da resistência em cultivares comerciais.
A preferência do produtor, expressada pela tendência ao aumento de área cultivada com germoplasma resistente, promove uma pressão de seleção na população do patógeno. Em consequência, o surgimento de isolados virulentos acaba promovendo uma quebra da resistência. Embora não seja possível generalizar, patógenos com alta mutabilidade vertical serão favorecidos pela repetitividade de variedades com genes idênticos para resistência.
Até o presente momento não estão disponíveis cultivares de soja com resistência vertical ao fungo P. pachyrhizi. A variabilidade presente no fungo é o principal fator na quebra dos genes de resistência vertical e que deve ser amplamente conhecida para que os programas de melhoramento tenham sustentabilidade.
Contudo, diferenças varietais com relação à taxa de progresso da doença têm sido observadas entre cultivares de soja (Figura 4), que apresentam mecanismos de resistência parcial diferentes entre si. O aumento da resistência durante a fase vegetativa e posterior diminuição na fase reprodutiva indica a necessidade do estabelecimento de estratégias protetoras nos estádios iniciais da infecção, que podem ser observados ainda nos estádios vegetativos.
Soja (3) – Época de semeadura
A partir da entrada da doença na lavoura é observada evolução da epidemia que irá resultar na severidade final. Esta evolução será diretamente relacionada à pressão de inóculo inicial, condições climáticas, condições de cultivo e momento em que a patogênese se estabelece na planta.
Se de um lado tem-se o desenvolvimento da população do patógeno, de outro a população do hospedeiro pode atingir um desenvolvimento que abrigue o inóculo, impedindo que os impactos de uma pulverização atinjam adequadamente o alvo.
O que tem sido observado nas últimas safras aponta para uma clara relação entre antecipação da semeadura, encurtamento do ciclo das cultivares e uma baixa densidade de inóculo. Cultivares de ciclo médio e tardio apresentam maior exposição ao inóculo devido ao maior período de permanência no campo, apresentando maior risco de ataque severo da doença.
Doenças radiculares tendem a ser favorecidas pela antecipação da semeadura, principalmente no sul do Brasil, onde o solo está mais frio. Podridão por Carvão pode ser favorecida por condições de baixa umidade no solo (mais comum em semeaduras tardias). Podridão por Phytophtora parece ser mais favorecida em períodos de maior umidade do solo.
Soja (3) – Nutrição
A busca por novas alternativas que visem auxiliar as técnicas de controle já existentes é imprescindível. Possibilitar às plantas condições necessárias para manifestar sua máxima resistência ou tolerância, considerando a primeira como a capacidade da planta em impedir a entrada e/ou limitar o desenvolvimento do patógeno e a tolerância como a habilidade da planta em suportar o ataque deste sem que ocorram perdas significativas na produção são fundamentais.
A nutrição das plantas, que é considerada um fator ambiental, também pode alterar a reação das plantas aos patógenos, influenciando o progresso da doença e, consequentemente, o controle. Usualmente um suprimento balanceado de nutrientes, que permita um crescimento ótimo, é também considerado ideal para a resistência de plantas.
O manejo das doenças deve considerar como um dos seus pilares o manejo fisiológico do hospedeiro. Para que a planta atinja a máxima resposta fisiológica é necessário que esta seja favorecida pelas práticas de manejo como nutrição, arranjo de plantas e densidade populacional, de forma que possibilite a máxima conversão de radiação incidente, dos nutrientes e da água.
Estratégias integradas de manejo que possibilitem a manutenção de área foliar sadia e a máxima atividade fisiológica da planta a partir do período crítico (florescimento) podem determinar o rendimento de grãos. Quanto maior a área foliar ativa da planta, maior será a garantia de rendimento.
Assim, a maximização da proteção da área foliar tem impacto significativo na resposta fisiológica da planta e, por consequência, na produtividade da cultura. Observando o complexo de doenças de final de ciclo e a ferrugem asiática a grande diferença é que a ferrugem consegue diminuir a possibilidade de captura de recursos pela precocidade de ataque e a doença de final de ciclo afeta no final do processo produtivo, conferindo um menor impacto na expressão de potencial da cultura. Neste sentido, a adubação com base em diferentes nutrientes influencia (positiva ou negativamente) a severidade das doenças da soja (Tabela 2).
Embora tanto a resistência como a tolerância sejam controladas geneticamente, o ambiente exerce grande influência sobre ambas, e a nutrição mineral representa um fator ambiental que pode ser, de certo modo, facilmente manejada. A nutrição mineral provoca mudanças na anatomia e na morfologia da planta, a qual altera consideravelmente sua resposta ao ataque de microrganismos patogênicos. Além disso, vários mecanismos bioquímicos relacionados à sua defesa são extremamente dependentes de seu estado nutricional.
Trabalhos realizados na Universidade Federal de Santa Maria estudaram o efeito da nutrição mineral com P, K e Ca na suscetibilidade da soja à ferrugem asiática visando dar suporte ao manejo integrado de doenças. A variação na quantidade de P e K adicionada ao solo, bem como as combinações de dosagens, influenciaram significativamente a severidade e a taxa de progresso da ferrugem da soja. A influência do K foi mais pronunciada do que P quando foi avaliada a severidade e taxa de progresso da ferrugem, ambos em baixas quantidades.
Este resultado conferido pelo K pode ser devido à ativação de enzimas envolvidas na respiração e fotossíntese, processos fornecedores de cadeias de carbono para a síntese de substâncias de defesa. Além disto, o K tem rápida reposição para a solução do solo, em comparação ao P, o que garante maior disponibilidade a planta. A adubação equilibrada entre P e K produziu os melhores resultados para ambas as cultivares. Quando esses nutrientes foram reduzidos ou não adicionados na adubação, foi observada maior severidade da ferrugem. Em contrapartida, a menor severidade e menor taxa de progresso foram observadas nas maiores dosagens dos nutrientes (170 e 140 Kg.ha-1 de P e K, respectivamente).
O manejo integrado, na sua concepção plena, é a agregação de todas as condições e práticas de manejo suficientes e necessárias para que a planta expresse-se fisiologicamente, permitindo a expressão genética de todo seu potencial de rendimento e minimizando seu grau de exposição à ação danosa dos patógenos. O fungicida é apenas um composto que vai auxiliar nesse processo.
Soja (3) – Arranjo populacional
Aliado ao componente nutricional, o manejo populacional da cultura assume grande importância na busca por aumentos de produtividade e no manejo de doenças. A adequação no arranjo de plantas através do aumento do espaçamento entre linhas pode permitir uma maior interceptação de radiação solar no terço inferior da planta. Nas folhas sombreadas há menor atividade fotossintética e, por consequência, ocorre redução na produção de fotoassimilados.
Desse modo, a redução no espaçamento entre linhas irá acelerar esse processo, levando as folhas baixeiras à senescência e causando um impacto negativo no rendimento da cultura.
Elmore (2004) ressalta que a interceptação de radiação solar é maximizada em espaçamentos equidistantes entre plantas, resultando em maiores produtividades na cultura da soja pelo melhor aproveitamento da luz.
O sombreamento da folha também promove a inativação do fitocromo, que é responsável pela percepção da luz. Assim, a velocidade de envelhecimento das células passa a ser influenciada pela redução na incidência de luz (FLOSS, 2004).
Desta forma é desencadeada uma sequência de processos fisiológicos que irão culminar na abscisão da folha, gerando desequilíbrio de energia na planta, com impacto direto na eficiência das defesas e favorecendo a infecção pelos patógenos. Além de preocupações sobre rendimento, também é considerado o impacto do espaçamento entre linhas sobre as doenças da soja (Figura 5).
A incidência do mofo branco (Sclerotinia sclerotiorum) aumenta sob condições de adensamento de plantas, pela formação e manutenção de um microclima quente e úmido por mais tempo, proporcionando condições adequadas para estabelecimento do patógeno (ELMORE, 2004).
A redução no espaçamento entre linhas de soja acarreta aumento na área foliar, com prejuízo à penetração e cobertura do fungicida, comprometendo a eficácia de controle químico. Além do mofo branco e das doenças de final de ciclo (DFC), a ferrugem asiática também beneficia-se do adensamento da cultura (BALARDIN & MADALOSSO, 2006).
Esses dados são coerentes com Debortoli et al. (2006), que trabalharam com espaçamentos de 45 e 30 cm, verificando diferenças de produtividade superiores a 1 ton ha-1 com o maior espaçamento (Figura 6). Da mesma forma, maior tempo de molhamento foliar, provocado pelo adensamento de plantas, favorece o aumento da taxa de progresso e disseminação da doença para as demais plantas.
PROTEÇÃO DA CULTURA
Controle químico – tratamento de sementes
O tratamento de sementes, além da proteção à semente é importante no estabelecimento da cultura. Tradicionalmente, o tratamento das sementes é realizado com produtos curativos, protetores e/ou sistêmicos que propiciam um residual de 12 a 15 dias, controlando um determinado tipo de patógenos.
Entretanto, o tratamento de sementes como alternativa que possibilite maior desenvolvimento radicular, aumento no vigor da plântula e proteção na parte aérea contra doenças já é uma realidade.
O tratamento de sementes como estratégia para redução do inóculo inicial que origina uma doença (BERGER, 1977) é importante para doenças como antracnose, mancha alvo e complexo de final de ciclo. Esta estratégia de controle também atrasa o início da epidemia e diminui a sua taxa de progresso (BALLICO, 2002).
O efeito positivo do tratamento de sementes na redução da severidade das doenças no estádio vegetativo sugere que essa prática possa retardar a aplicação de fungicidas na parte aérea e reduzir o número de aplicações.
Controle químico – preventivo x curativo na parte aérea
O sucesso do controle químico das doenças da soja depende da fase em que se encontra a patogênese e a que pressão de inóculo que o fungicida é submetido. O controle realizado após a visualização dos sintomas (curativo e erradicante) afeta negativamente a eficiência do ingrediente ativo, bem como o período residual do fungicida (VITTI et al., 2004). Os fungicidas têm sua eficácia muito reduzida quando aplicados após o estabelecimento da ferrugem (Figura 7).
Um atraso de sete dias na aplicação do fungicida para controle de ferrugem asiática (após a detecção da doença) pode ser suficiente para produzir desfolha significativa da cultura. A aplicação do fungicida de forma curativa afeta a eficácia de controle, havendo redução na severidade e no progresso da ferrugem, porém com eficiência comprometida nas aplicações realizadas a partir do terceiro dia após a inoculação.
O efeito curativo erradicante tende a ser mais pronunciado nas primeiras 48 a 72 horas após a infecção dos patógenos. Um dos principais fundamentos do controle fungicida preventivo é a prevenção do aparecimento de mutantes resistentes da ferrugem. A utilização do fungicida em baixa população do patógeno, além de reduzir o inóculo inicial dentro da lavoura, elimina as chances de um mutante resistente ou esporo predominar na população do patógeno (Figura 7).
Neste aspecto, a primeira aplicação em base forte (estrobirulina sistêmica mais triazol) permite uma eliminação racional destas células ou esporos resistentes por atuar na respiração dos esporos e corpo do fungo (estrobirulina) e formação de membranas do fungo (triazóis). Este duplo mecanismo de ação permite maior estabilidade dos sistemas de controle e fungicidas atuais.
Controle químico – preventivo x curativo: residual
Aplicações curativas promovem uma alteração na ação do fungicida devido ao estádio de progresso em que a doença se encontra, enquanto que nas aplicações preventivas o fungicida permanecerá um período de tempo nos tecidos da planta sem que o patógeno tenha iniciado o processo de infecção.
Assim, o residual efetivo em aplicações preventivas é mais prolongado, já que a totalidade do tecido vegetal encontra-se metabolicamente favorável à ação do fungicida, aliado à ausência de inóculo sobrevivente após a aplicação.
As aplicações preventivas possibilitam um residual mais longo em relação às aplicações curativas devido ao somatório de condições fisiológicas da planta, ao nível de inóculo disponível para infecção, aliado a uma maior probabilidade de o produto ser depositado em uma maior percentagem de tecido sadio da planta.
O período residual será resultado da estratégia de controle estabelecida na forma de um plano de manejo integrado (Figura 8). Este pode ser impactado por fatores tão diversos quanto o momento de aplicação do fungicida em relação ao desenvolvimento da planta ou da patogênese, densidade populacional do patógeno, idade do tecido, nutrição e diversos componentes de manejo fitotécnico da planta, ou mesmo da expressão de genes menores associados à resistência parcial (Figura 9).
Nas aplicações preventivas, o efeito residual do fungicida é favorecido pela ausência da interação entre o inóculo do patógeno e a planta hospedeira. Em adição, o momento adequado de proteger uma planta também tem relação à associação entre os estádios fenológicos e os momentos fisiologicamente críticos na planta.
Na transição entre o período vegetativo e o reprodutivo, ocorre aumento no dreno de energia para os órgãos de reserva, aumentando a ineficiência dos processos de defesa que se tornam mais onerosos do que benéficos, do ponto de vista de equilíbrio energético. Esta dinâmica favorece o desenvolvimento da doença e reduz a atividade do fungicida nos tecidos da planta.
O período residual de um fungicida, característica peculiar aos diversos grupos químicos, consiste na manutenção de um ingrediente ativo no interior dos tecidos da planta em concentração suficiente para inibir ou retardar a infecção causada por um patógeno. Neste caso, considera-se como residual absoluto o período de tempo em que os fungicidas podem conferir proteção à planta, ou seja, benzimidazóis (15 dias), triazóis (22 e 25 dias) e estrobirulinas (27 e 30 dias).
No caso de misturas de fungicidas de grupos diferentes, o efeito sinérgico poderá conduzir a um período residual absoluto maior do que observado considerando os produtos isolados. Na ausência de sinergismos entre os componentes da mistura pode ser observada uma relação entre o residual da mistura e o observado pelo componente cujo residual for o de maior duração.
Por outro lado, considerando-se os diferentes estádios da patogênese como referencial para o momento da aplicação de um ingrediente ativo, o residual efetivo é conceituado como o período de tempo compreendido entre a deposição do fungicida sobre a superfície da planta e o surgimento de sintomas em magnitude superior à verificada no momento da aplicação.
Dois cenários são possíveis: o fungicida é aplicado antes do estabelecimento da infecção ou já em presença de infecção estabelecida. Como um longo período de tempo pode decorrer entre a infecção inicial e a formação de sintomas detectáveis, o residual efetivo manifesta-se de forma diferente caso a aplicação do fungicida seja realizada de forma curativa ou erradicante.
O período residual absoluto de um determinado ingrediente ativo é apenas uma referência já que, por tudo o que é feito do ponto de vista de manejo de uma cultura e da dinâmica populacional do patógeno, o residual efetivo converte-se no residual realmente alcançável sob condições de campo.
Além disto, a maior compreensão do próprio conceito de doença permite entender, de forma inequívoca, a dinâmica fisio-populacional de plantas e patógenos, possibilitando extrair maior benefício do controle químico, entendido neste ponto como maior período residual efetivo.
O período residual efetivo de um fungicida perpassa as características intrínsecas que o ingrediente ativo apresenta sob condições experimentais, podendo variar em função da relação entre o curso da patogênese e as condições fisiológicas gerais da planta.
De maneira mais explícita, entende-se que o período residual será resultado da estratégia de controle estabelecida na forma de um plano de manejo integrado, e que pode ser impactado por fatores tão diversos quanto o próprio momento de aplicação do fungicida em relação ao desenvolvimento da planta ou da patogênese, densidade populacional do patógeno, idade, nutrição e diversos componentes de manejo fitotécnico da planta, ou mesmo da expressão de genes menores associados à resistência parcial.
O cenário observado em doenças como requeima da batata, brusone do arroz, ferrugem do trigo ou ferrugem asiática da soja, em contraste à pinta preta do tomateiro, cercosporiose da soja ou septoriose do trigo, indica a necessidade de uma leitura cuidadosa de doenças cuja taxa de progresso pode acarretar uma explosão populacional do patógeno ou daquela cuja progressão é mais lenta. Mesmo que o controle preventivo, por conceito, considere a deposição de um ingrediente ativo previamente ao início da patogênese, o resultado final será diferente entre as doenças do grupo cuja taxa de progresso é mais elevada.
O que esperar, então, de uma aplicação realizada após o estabelecimento de uma doença, mesmo que sua progressão seja mais lenta?
A aplicação de um fungicida, após o início da infecção, sofre reduções tão mais drásticas no residual quanto maior for a densidade populacional do patógeno no momento da aplicação. É provável que alguns componentes da patogênese, tais como, número e distribuição dos locais de infecção aliado à taxa de progresso do fungo, possam obrigar ao produtor aumento no número de aplicações.
Nestas condições o resultado final é um número excessivo de aplicações associado a um retorno financeiro incoerente ao investimento realizado e que potencialmente poderia ser mais satisfatório, se respeitadas as condições da planta, do patógeno e de sua interação. Na interação fungicida – patógeno as aplicações curativas resultam em dificuldade crescente do fungicida em eliminar ou reduzir a evolução da doença.
Nessas condições, o aumento na intensidade de atividade metabólica de defesa da planta reduz a disponibilidade de elementos constitutivos que possam estar envolvidos na atividade do fungicida, acelerando sua degradação e reduzindo o período cuja concentração do ativo na planta mantenha-se em patamar de letalidade eficiente.
Em contrapartida, nas aplicações preventivas, o efeito residual do fungicida é favorecido pela ausência da interação entre o inóculo do patógeno e a planta hospedeira, maior concentração de compostos constitutivos devido à reduzida produção de compostos induzidos que acabam, em conjunto, permitindo uma lenta extinção do ativo nos tecidos da planta.
Em adição, o momento adequado de proteger uma planta também tem relação à associação entre os estádios fenológicos e os momentos fisiologicamente críticos na planta. Um exemplo é a produção de etileno, que acelera a degradação de tecidos ao mesmo tempo em que favorece o estabelecimento da doença.
Nestas condições, naturalmente o residual do fungicida vai decrescer. Na transição entre o período vegetativo e o reprodutivo, ocorre aumento no dreno de energia para os órgãos de reserva, aumentando a ineficiência dos processos de defesa que se tornam mais onerosos do que benéficos do ponto de vista de equilíbrio energético.
Esta dinâmica favorece o desenvolvimento da doença e reduz a atividade do fungicida nos tecidos da planta. O estado nutricional da planta tem efeito direto nesta dinâmica, pois uma planta bem nutrida tem maior capacidade de reduzir o impacto desse desequilíbrio energético pela manutenção dos tecidos fisiologicamente ativos por um período mais prolongado.
Outro fator de relevância prende-se à associação entre a nutrição da planta e seu manejo cultural. Alterações no arranjo de plantas devido ao aumento no espaçamento entre linhas ou à variação na densidade de plantas podem propiciar maior incidência de radiação solar em toda a planta, mantendo as folhas com uma maior atividade fotossintética mesmo no dossel inferior. Fatores microclimáticos como redução no período de molhamento foliar, aumento de aeração e redução na concentração precoce de etileno retardam ou inibem a infecção pelo patógeno. Consequentemente, além de uma deposição mais facilitada do fungicida, a redução de atividade patogênica irá resultar em um aumento no residual do fungicida.
Por outro lado, o adensamento de plantas, juntamente com um elevado índice de área foliar, favorece a atividade patogênica, prejudicando a penetração e deposição de fungicida sobre o alvo, refletindo no seu residual.
O residual do fungicida será reduzido, obrigando maior número de aplicações, mas cada vez menos eficazes, devido à associação dos fatores de má penetração, lenta atividade metabólica da planta e, proporcionalmente, maior densidade populacional remanescente a cada aplicação.
Além dos fatores nutricionais e do manejo cultural é importante destacar que a manifestação da resistência parcial através de um maior período de latência e menor taxa de progressão da doença acarreta menor densidade populacional do patógeno.
Na medida em que a pressão de inóculo diminuir sobre os tecidos do hospedeiro será observado um aumento no residual do fungicida, à semelhança do observado do ponto de vista fisiológico.
Se uma correta tecnologia de aplicação for associada a uma adequação no arranjo espacial e populacional das plantas, favorecendo maior deposição e cobertura das folhas de todo o dossel da planta pelo fungicida aplicado, o residual dos mesmos será aumentado.
A adequação da tecnologia de aplicação compreende um ajuste de variáveis como volume de calda, pontas de barra que produzam DMV e DMN compatíveis com o dossel que se busca cobrir.
Outros fatores como arquitetura da planta, estádio fenológico em que o fungicida é aplicado e local mais provável de infecção são fatores que afetarão o resultado final de uma aplicação ou, mais especificamente, o residual do fungicida. Adicionalmente, o horário e as condições climáticas no momento da aplicação comprometem o residual de um fungicida.
É importante enfatizar que toda a vez que a deposição de um fungicida for afetada por quaisquer fatores e que uma quantidade inferior de ingrediente ativo for aplicada sobre a planta, todos os componentes populacionais do patógeno aliado às variáveis fisiológicas da planta produzirão um efeito sobre o residual do fungicida ainda mais relevante.
A associação entre a tecnologia de aplicação de fungicidas líquidos e o manejo fitotécnico pode proporcionar maior adequação no manejo fitossanitário. A tendência atual é a prática de modalidades que requerem menor volume de aplicação.
Segundo Giordani (2002) cultivares de soja apresentam diferentes arquiteturas e, dependendo do índice de área foliar sadio, um percentual semelhante na severidade da doença poderá acarretar danos diferenciados entre os cultivares.
Conclusão
A garantia de um controle confiável não depende apenas do ingrediente ativo, mas de todos os aspectos envolvidos na estratégia de manejo das doenças. É fundamental que a utilização do controle químico seja entendida como um complemento do manejo integrado de doenças.
A conjugação dos fatores de dinâmica epidêmica da doença, limitações operacionais de cada propriedade, limitações de residual e modo de reação que os produtos químicos possuem devem ser consideradas e, principalmente, a necessidade de não comprometer a sustentabilidade do agronegócio da soja.
Para que a doença seja controlada, a expressão fisiológica deverá ser tão eficiente quanto a possibilidade de conversão de recursos, ao mesmo tempo em que as ações de degradação causadas pelas doenças sejam minimizadas.
O manejo integrado na sua concepção plena é a agregação de todas as práticas de manejo suficientes e necessárias para que a planta se expresse fisiologicamente, permitindo a expressão genética de todo seu potencial de rendimento e minimizando seu grau de exposição à ação danosa dos patógenos. Neste contexto, o fungicida é apenas um composto que vai auxiliar nesse processo.
Por outro lado, se a planta não tiver condições de aproveitar essa ferramenta, o processo torna-se ineficiente.
Referências Bibliográficas
ELMORE, R. W. Soybean seeding rates. Lincoln: Extension, Institute of Agriculture and Natural Resources, 2004. 4p.
FLOSS, E. L. Fisiologia das plantas cultivadas: o estudo que está por trás do que se vê. Passo Fundo: Ed. Universitária/UPF. 2004. 528p.
BALARDIN, R.S.; MADALOSSO, M.G. Fatores que afetam a eficiência na aplicação de fungicidas. In: BORGES, L. D. Tecnologias de aplicação de defensivos agrícolas. Passo Fundo, 2006. p.63-67.
DEBORTOLI, M. P.; et al. Efeito do arranjo de plantas sobre o progresso de ferrugem asiática na soja. Revista da Sociedade Brasileira de Fitopatologia, Salvador, v.31, n.1, p.129-129, 2006.
BERGER, R.D. Application of epidemiologycal principles to achieve plant disease control. Annual Review of Phytopathology, v.15, p.165-183, 1977.
BALLICO, L.J. Controle integrado da ferrugem da folha em aveia. 124f. (Dissertação de mestrado). Passo Fundo. Universidade de Passo Fundo. 2002.
VITTI, A.J. et al. Efeito residual e curativo de fungicidas para o controle de ferrugem da soja (Phakopsora pachyrhizi). Fitopatologia Brasileira, Brasília, v.29, p.290, 2004.
GIORDANI, R.F. Controle das doenças de final de ciclo e oídio na cultura da soja. 102f. (Dissertação de mestrado) Santa Maria. Universidade Federal de Santa Maria. 2002.
Para saber mais sobre esse assunto, clique no card abaixo:
Ação Ampla: Manejo de doenças do milho com associação de fungicidas de amplo espectro