Neste conteúdo, você vai aprender sobre:
– Importância do microbioma do solo para a produção agrícola; e
– Práticas de manejo capazes de aumentar a diversidade microbiana do solo.
O solo como habitat para a biodiversidade
O solo é responsável por abrigar uma das maiores diversidades biológicas da biosfera. Um dos principais atores dessa multiplicidade de formas de vida são os organismos que nele habitam, sejam eles classificados dentro da fauna do solo (macro, meso e microfauna) ou como microrganismos (MOREIRA & SIQUEIRA, 2006). Dentre os seres microscópicos mais conhecidos e abundantes, tem-se os fungos e as bactérias, os quais são responsáveis (em maior ou menor grau) por funções de grande importância para a produção agrícola, como por exemplo: ciclagem de nutrientes, fixação biológica de nitrogênio (FBN), decomposição de resíduos vegetais, estabilização de agregados, promoção de crescimento e proteção às plantas.
Por conta destas relevantes funções ambientais, o estudo sobre microrganismos de solo vêm se ampliando, principalmente para os que se encontram associados (taxonômica e funcionalmente) às plantas e ao solo em um dado ambiente, com o termo “microbioma do solo” sendo cunhado nos últimos anos para representar de forma mais robusta esse conjunto de interações essenciais ao desenvolvimento dos vegetais. Assim, os microrganismos do solo podem ser divididos em ao menos três grupos, sendo eles:
(1) “os bons” (the good) – que exercem funções benéficas ou nulas aos vegetais;
(2) “os maus” (the bad) – capazes de gerar enfermidades às plantas;
(3) “os feios” (the ugly) – capazes de utilizar o solo como hospedeiro temporário e com isso causar doenças aos humanos (MENDES et al. 2013).
Logo, a depender da forma com que o recurso natural solo seja tratado (ou manejado), é possível que a estruturação microbiana desse ambiente privilegie o desenvolvimento de certos grupos em detrimento de outros, de modo a facilitar ou não o desenvolvimento vegetal. Em outras palavras, o aumento de indivíduos do grupo “the good” pode favorecer, por exemplo, a eficiência energética da agricultura via maior absorção de água, acesso a nutrientes e tolerância a patógenos, enquanto que a expansão dos grupos “the bad” e “the ugly” podem pôr em xeque a sanidade das culturas e, por conseguinte, a produção de alimentos.
Diminuição da diversidade microbiana do solo e problemas para a produção agrícola
Como visto anteriormente, a adoção de manejos inadequados pode gerar a desestruturação das comunidades microbianas do solo. Porém, esses efeitos podem ser ainda mais graves, considerando o potencial que essa desestruturação tem em reduzir a diversidade microbiana e impactar negativamente as relações solo-planta-microrganismos. Como produto, evidencia-se o surgimento de comunidades menos resilientes a estresses e mais suscetíveis ao estabelecimento e persistência de patógenos, necessitando de maior aporte de insumos externos para alcançar produtividades semelhantes a que um ambiente em equilíbrio poderia desempenhar. A longo prazo, este formato de agricultura acabará degradando a qualidade do solo (características físicas, químicas e biológicas), não sendo mais viável economicamente a produção, ocasionando o abandono da área e a pressão de expansão das fronteiras agrícolas para áreas de proteção.
Manejos capazes de aumentar a biodiversidade do solo
Algumas práticas de manejo são capazes de auxiliar na constituição de comunidades microbianas e nas interações a serem estabelecidas entre os microrganismos (positivas ou negativas). O aumento da biodiversidade do solo, favorecendo o equilíbrio e a autorregulação das comunidades microbianas, pode ser alcançado com a adoção de manejos como:
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sistema plantio direto,
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rotação de culturas,
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cultivo entre linhas,
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utilização de mix de plantas de cobertura,
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sistemas integrados de produção agropecuária (SIPA)
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manejo integrado de pragas (MIP).
A adoção de manejos capazes de aumentar a diversidade vegetal acima do solo, por exemplo, gerará o aporte de resíduos vegetais com diferenças na composição elementar e bioquímica (ex.: relação C/N, teores de lignina, etc.), mantendo o solo coberto por longo período do ano. A cobertura do solo proporciona disponibilidade de carbono para atividade microbiana, diminuição das flutuações térmicas e manutenção da aeração, assim como umidade e redução nas taxas de erosão. Somado a isso, a diversidade de plantas também poderá possibilitar que sejam estabelecidos sistemas radiculares com diferenças funcionais e morfológicas, viabilizando variedade de nichos devido a composição e quantidade de exsudatos radiculares (KUŠLIENE, G. et al. 2014; ERKTAN et al. 2018), e por consequência ocasionando diversidade microbiana. Na Figura 1, exemplifica-se a diversidade vegetal acima e abaixo do solo em diferentes sistemas de cultivo, elucidando os conceitos abordados até o momento.
Figura 1. Exemplificação de diversidade acima e abaixo do solo ocorridas em monocultivos (1a), cultivos entre linhas (1b), mix de culturas de cobertura (1c) e sistemas integrados de produção agropecuária com componente agrícola e florestal (1d).
Fonte: Adaptado de Erktan et al. (2018)
Além das práticas ora mencionadas, o trânsito controlado, bem como o uso de insumos externos (ex. fertilizantes e defensivos químicos) de forma consciente, compreendendo-se os períodos de maior necessidade da planta e adotando estratégias de manejos visando o monitoramento de pragas e doenças, farão com que a perturbação desse ambiente seja de menor intensidade, favorecendo a recuperação da comunidade microbiana frente a estas práticas. Por fim, as características químicas, físicas e biológicas do solo serão favorecidas, tornando este ambiente mais fértil, menos suscetível à invasão de patógenos, e com menor ocorrência de processos erosivos e de compactação. A introdução destes manejos pode tornar o sistema agrícola mais produtivo, sustentável e economicamente viável.
Referências:
ERKTAN, A., MCCORMACK, M.L., ROUMET, C. (2018) Frontiers in root ecology: recent advances and future challenges. Plant and Soil, 424, p. 1-9. doi: https://doi.org/10.1007/s11104-018-3618-5
KUŠLIENE, G. et al. (2014) Medium-term response of microbial community to rhizodeposits of white clover and ryegrass and tracing of active processes induced by 13C and 15N labelled exudates. Soil Biology and Biochemistry, v. 76, p. 22–33, 2014.
MENDES, R.; GARBEVA, P.; RAAIJMAKERS, J. M. (2013) The rhizosphere microbiome: Significance of plant beneficial, plant pathogenic, and human pathogenic microorganisms. FEMS Microbiology Reviews, v. 37, p. 634-663. doi: https://doi.org/10.1111/1574-6976.12028
MOREIRA, F.M.S., SIQUEIRA, J.O. (2006) Os organismos do Solo. In.: MOREIRA, F.M.S., SIQUEIRA, J.O. Microbiologia e Bioquímica do Solo. 2ª edição. Editora UFLA. ISBN: 85-87692-33-x. 729p.